O belo é umas das áreas em que a
Estética, como disciplina tentou definir um conjunto de conceitos evolutivos
relacionando as ideias, a cultura, o social e a representação de formas
diversas pela expressão artística. A Estética foi já lida de muitos modos e
talvez a mais interessante seja aquela que nos diz que ela é uma forma sensível
de conhecer, algo como uma alternativa à razão. Os objectos estéticos criam em
nós formas de sentir. É consensual que o belo se associa muitas vezes ao que
agrada, ao que dá uma satisfação capaz de um entusiasmo. O belo tem si as suas
próprias formas de beleza, ou somos nós como observadores a construir um
conceito?
Quando entramos numa igreja
românica, ou numa catedral gótica, ou num templo budista a beleza emerge como
uma realidade. Esses são espaços de beleza. A primeira pergunta a fazer é por
que chamamos belos a esses espaços e por que os espaços de oração e
recolhimento são portadores de uma ideia de Beleza? A segunda questão
pertinente é a de reconhecer que ul livro como a Bíblia está ausente da
formulação de belo. A única aparição da ideia de belo refere-se ao reino de
Salomão e a sua comparação com os lírios do campo. A única referência de belo
nas Escrituras Sagradas é uma referência natural e relativo a uma dimensão
espontânea. Terceira questão que importa fazer, há algo de imutável no belo, há
nele algo de permanente?
Quando pensamos em belo vem-nos à
mente que ele como tudo o que envolve a vida humana é relativa aos tempos
sociais e culturais. O que hoje achamos belo amanhã muda de sentido, pois os
códigos de beleza alteram-se. E, no entanto ao olharmos para a Vénus de Milo,
ou o Discóbolo de Mirone, expressões de séculos encontramos ainda ali um ideal
de belo, uma representação que achamos bonito, tal como o podemos ver num retrato
de Vermeer ou numa natureza de Monet. Encontramos aí uma representação substantiva
de belo, ainda que saibamos que essa aquisição do belo se fez pelos valores
sensoriais, algo que acedemos de uma forma diversa quando tentamos definir o
Bem ou a Verdade.
Quando falamos do belo como experiência sensorial
perguntamo-nos como essa aquisição se faz em cada um de nós. É pela educação,
ou apenas por algo que cada um de nós pode ou não ter incentivado como uma
procura. As crianças são um exemplo muito significativo, dessa forma de
encontrar um modo de comunicação, como se essa observação fosse um diálogo
entre nós e a arte, como entre cada um de nós e outra pessoa, ou com a simples
observação de uma paisagem, da leitura de um livro, algo a que poderíamos
chamar uma Graça. O belo que se apresenta como alago que está para lá da
compreensão.
João Bénard da Costa (2) contava uma história interessante,
a de que uma criança ao ler excertos dos Lusíadas dizia, "Eu não percebo
nada disto, mas isto é tão bonito". E talvez que em muitas circunstâncias
o belo seja não só o que ultrapassa a compreensão, ou que está para além dela,
mas que o encontro com algo de maravilhoso seja a incompreensão. A visita a um
templo oriental, como o templo dourado em Kyoto provoca um sentido diferente de
percepção do espiritual, mas ainda assim achamo-lo belo. E, todavia
compreendemos a sua funcionalidade?
Não a percebemos e talvez seja isso que o belo seja, o que
não se percebe tão bem, ou se percebe menos e, justamente porque a compreensão
é do nível do mistério. Podemos visitar o Epidauro, conhecer as características
técnicas daquele espaço, mas a transcendência pode não nos contemplar. E assim
o que fazemos é o estudo da Estética, em que relacionamos a a representação do
belo com as ideias filosóficas de um tempo. E aqui temos muitas possibilidades.
Desde os Gregos que a ideia de belo evoluiu. A sabedoria foi
a primeira forma de belo, foi nas palavras dos poetas que ela primeiro se
definiu, com o que conhecemos da obra de Homero e Hesíodo. O belo relaciona-se
com essa dimensão essencial de todos, a vida ainda. Como a podemos
alimentar? Com que palavras? Com que sabedoria habitaremos a vida e a sua
essência, o seu coração? Como a entendemos entre uma ideia secular de destino,
um grito de ar, de visão entre momentos escassos, esse nada que varia entre
promessas e nenhuma crença, apenas um fio de escuro. Parece pois essencial ter
algum pensamento, descobrir nela uma sabedoria para a construir, para a
edificar. A palavra sabedoria conduz-nos à ideia de uma aprendizagem.
Sophia
criou sem dúvida uma ideia de belo que retomava valores clássicos, mas que os
afirmava em novos tempos. Fazia a ligação entre o Belo e o Bem. Com ela a
experiência estética transforma-se numa experiência ética e deu-nos essas
palavras essenciais a da relação justa entre as coisas e os homens. É dessa
construção de um valor inteligível da vida, a que o belo se encontra associado.
É dessa viagem desde os Gregos aos inícios da modernidade que aqui falaremos em
curtos posts.
(1) Kohn Keats. (1841).
"Endymion", in The poetical works of John Keats. London: William Smith.
(2)
João Benard da Costa, Ciclo de conferências "Ecce Homo", Lisboa, Maio
de 2007.
Imagem
- Pavilhão prateado, (Ginkaku-ji) - Kyoto, (séc. XV).
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