sábado, 19 de setembro de 2015

Eleições Legislativas - 2015 (9) - Ler para compreender (VIII)

Só tecnocratas sem consciência ética podem forçar o Estado a alimentar uma política de austeridade que faz crescer o desemprego e a pobreza; só tecnocratas sem sentido moral da existência podem diminuir os parcos subsídios aos reformados, forçando-os a diminuir as despesas na alimentação ou nos medicamentos; só tecnocratas sem o sentido sagrado da existência (por mais que se confessem católicos e matriculem os seus filhos em colégios religiosos) podem lançar na miséria casais que, desempregados ambos ou apenas um, deixam de ter capital para suprir as despesas com a compra da casa; só tecnocratas sem o antigo sentido da decência política, como arte de fazer bem comum, podem promover a desertificação do interior do País, fechando correios, finanças, tribunais, escolas, postos de saúde, abandonando as populações a si próprias. Se o País despertar do seu sonambulismo, este "desvio tecnocrata" deve ser rigorosamente castigado nas urnas. A decência democrática e os valores permanentes de Portugal e da Europa assim o exigem. Ou, então, caminharemos sonambulamente para o Terceiro Mundo, aproximando-nos de países como o Paraguai ou a Costa do Marfim, os quais a elite vive luxuosamente e a população na miséria. 

É um dos melhores livros publicados nos últimos meses sobre a temática da situação económica, social e política e cultural do País e essencial para as escolhas que as pessoas devem fazer, se não quiserem empobrecer em favor de partidos tecnocratas e suas ligações sociais, económicas e institucionais. Portugal, um país parado no meio do caminho (2000-2015) é mais um título de Miguel Real, onde os dados conhecidos, a realidade cultural, económica e social é utilizada como matéria-prima para um estudo de psicologia social, os quadros mentais de um País. Em certo sentido Portugal, um país parado no meio do caminho (2000-2015) tenta retomar essa leitura interior de organização cultural que de um modo mais amplo Eduardo Lourenço traçou para os períodos longos. 

Os dados económicos, sociais e culturais que nos chegam de frente, do programa neo-liberal dos tecnocratas de serviço que PS, PSD e CDS corporizam em decisões concretas dão-nos esse quadro do país sonâmbulo, resignado e sem fôlego ou capacidade de resistir à destruição de si próprio. Entre a ilusão europeia, a ascensão dos tecnocratas e os neo-liberais o País está fragmentado de vontade em construir algo semelhante a uma sociedade coerente e digna. 

O livro encontra-se dividido em duas partes de dimensões muito diferentes. A saber:

  1. Apresentação - Os contornos actuais do sonambulismo;
  2. Portugal - um país parado no meio do caminho (2000-2015) - dos mitos da modernização à substituição de políticos por tecnocratas e as contradições de valores emergentes que se perderam num sentido de ausência de decência política ou de sentido espiritual da existência. Nesta parte analisam-se as representações imagéticas de grupos sociais e o mimetismo que o poder faz dessas imagens, à procura da glória fácil, mas sem a imaginação dessas pessoas, dessas imagens.
Portugal, um país parado no meio do caminho (2000-2015) é um livro essencial. O facto de estar em zonas quase escondidas nas principais livrarias revela o gosto que impera, a ausência de conhecimento e a mistura de produtos meramente ideológicos com os que analisam a sociedade. Caso os portugueses não acordem e insistam no erro da cegueira apenas poderão ser o que um poder sem vivência moral deseja - a ganância de uma minoria. É preciso recuperar a lucidez de pessoa, como a do padre Manuel Antunes que decretava nas suas admiráveis palavras de combate o repudio pelo "liberalismo atomista".

1 comentário:

  1. Miguel Real é um bom pensador, por sinal, meu colega e que eu conheço...acho que o conteúdo do livro é excelente bem como a crítica que fazes...estão os dois de parabéns. Vale a pena ler!

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