domingo, 5 de julho de 2015

Feliz aniversário Mia!

Tudo o que tenho não tem posse:
o rio e suas ocultas fontes,
a nuvem grávida de Novembro,
o desaguar de um riso em tua boca.

Cansa-me ser quem serei
porque em tudo esse outro
se parece com o que sou.(1)

Mia Couto é um autor moçambicano que tem reinventado a língua portuguesa dando-nos territórios por onde se ligam a identidade de uma cultura, o património colectivo de uma comunidade, saltando fronteiras, dando força nova às possibilidades da Literatura. Há trinta anos a publicar títulos, recordamos Terra sonâmbula (1992), A Varanda de Frangipani (1996), A Chuva Pasmada (2004), O Beijo da palavrinha (2006), Pensageiro frequente (2010), Tradutor de Chuvas (2011), A Confissão da Leoa (2012) ou o mais recente Jerusalém. 

Mia Couto está imerso como pessoa na realidade de uma cultura de um país, ainda com restos de heranças coloniais, vivendo uma construção política e social com situações mal resolvidas vindas do processo de descolonização e que assim necessita de se olhar, de se pensar como conjunto humano. Tem sido esse o papel de Mia Couto e da sua literatura. Tem dado novas formas à linguagem integrando a riqueza humana e cultural de Moçambique, expondo a sua respiração, mas também falando sobre o medo e o que povoa o quotidiano de figuras quotidianas.

A literatura de Mia Couto constrói uma ligação entre o fundo africano e aquilo que pode ser uma "modernidade" no sentido de uma sociedade mais partilhada, mais coerente com os valores de uma matriz europeia. A sua literatura desmonta as lendas, os mitos tentando ligar o mundo rural e urbano, dando consistência a uma humanidade que se religa entre a realidade e um pensamento mágico. Mia Couto dá-nos um conjunto de valores de grande significado, pois ensina-nos que a memória e a cultura são factores de grande significado na identidade dos povos. É a mais nobre função da literatura

(1) Jornal de Letras, Ano XXXII, Número 1114

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