segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Governar entre o medo e a mentira (III)

Na incorporação da culpa feita aos mais fracos, e na sua ausência no aparelho de Estado e aos socialmente mais favorecidos, que relação existe com o que poderíamos chamar a circulação do poder. E aí, qual é  a penalização que há?
 Um dos mais importantes banqueiros esqueceu-se de declarar cinco milhões de euros ao fisco. Acaso o ministro deixou de jantar com le? Pelo contrário.

 Revolta-me sempre penalizar os mais fracos, sempre interiorizar a culpa aos mais fracos. Mesmo que eles tenham alguma culpa, socialmente há um enorme desiquílibrio emquem tomou as principais responsabilidades e sobretudo não culpabilizar retrospectivamente as gerações porque usaram as oportunidades que tiveram na sua vida e não foram elas que decidiram como era o crédito bancário, não foram elas que decidiram de forma tão desiquilibrada porque elas tinham algum provento material que lhes garantia que isso não lhes destruía a sua vida.

O que aconteceu é que passamos de uma nação de pessoas solventes para uma nação de pessoas insolventes. Porquê? Pelo fisco. Têm a culpa de ser insolventes? Têm a culpa de serem eles a pagar o custo de uma crise que efectivamente atinge desigualmente a sociedade portuguesa? Há desigualdade na penalização pela crise, enorme desigualdade e isso é socialmente inaceitável. 

A interiorização da culpa teve sucesso neste processo de desagregação dos laços sociais, feita de um modo em que os mais velhos estão a prejudiacrt os mais novos, que os empregados estão a prejudicar os desempregados. Nada disto é provavel em estatísticamente. São os patrões que dizem que a legislação laboral não é um obstáculo nas empresas. É o governo que diz que é. É um dos aspectos que tem a ver com a desagregação do sentimento nacional. Muita gente come tudo o que lhe põem no prato.

E depois o assédio ao pódium público, com meia dúzia de excepções, foi dominado por uma linguagem política em nome da economia, do economês, que é uma preversão da linguagem política. Essa linguagem que se tornou dominante leva as pessos a interiorizarem a culpa e acharem que não há alternativa e quando por qualquer motivo se propõem alternativas, imediatamente se lhes diz, que numa semana não há dinheiro para salários, isto após três anos com os sacrifícios impostos, impliva que alguma coisa correu terrivelmente mal.

O que verdadeiramente não há dinheiro para pagar é a enorme dimensão da dívida pública que aumentou nos últimos anos. Esse é que é o problema. E sem economia, dificilmente será pago. Vivemos num reino de logro, realmente. O défice previsto era de 3,5%, estamos em 5%. Como é que foi um sucesso? O desemprego subiu para lá do previsto. É um sucesso!?

E com a ideia de distinção entre recuperação económica e social. O discurso é, estamos em pleno çilagre económico, mas ele não se vai reflectir na vida das pessoas tão cedo. Isto não tem sentido em democracia, o que significa que os resultados desse milagre económico não são distribuídos como deviam ser. E não são, porque nos últimos dois anos, os canais que permitiam essa distribuição foram destruídos. 

Ou seja, a desigualdade cresce também porque os mecanismos reguladores redistributivos em qual assenta uma sociedade como a nossa, esses mecanismos foram afunilados para os debaixo  e alargados para os de cima. E é por isso que esta injustiça dos dias de hoje, que a injustiça é onome que temos lhe dar é de facto eticamente inaceitável. E por isso eu tenho muita dificuldade em que de facto me tomem por parvo. Não só por uma questão subjectiva de eu não gostar; eu não gosto realmente. Poderia ser só eu. Não! Infelizmente acho que são vocês todos que estão a ser tomados por parvos. E também tenho a certeza quase absoluta que vocês também não gostam.

"O sentido do fim ou o fim consentido?", Porto, Serralves, 02.04.2014
(parte de uma intervenção de José Pacheco Pereira)

Sem comentários:

Enviar um comentário