terça-feira, 20 de maio de 2014

As eleições europeias

"Na medida em que a hipótese central do totalitarismo repousa sobre o"tudo é possível", uma cidadania sensata e uma acção racional devem repousar sobre a hipótese inversa de uma constituição da natureza humana, ela própria justificada pela sua capacidade de abrir, de preservar ou reconstruir um espaço político" (1)


Os candidatos às eleições europeias há cinco anos propounham-nos palavras tão claras, como "somos europeus", "direito ao TGV na Europa" ou "Erasmus para todos os alunos universitários." O candidato da oligarquia que domina politicamente a União europeia, a sua comissão propunha apenas o que as circunstâncias ditavam. 

Alguém escreveu que a Europa compreende sempre na substânciaa crise anterior, pois os grupos e os partidos que influenciam ainda se imaginam no centro do mundo, mas são um "subúrbio esquecido da política mundial", onde a sua influência se fica pela fixação dos habitats dos castores, ou das migrações das borboletas, jamais para discutir os problemas reais que se vive na Europa e nas suas fronteiras. A solidariedade europeia não nasceu com ela e foi um mito dos tempos em que os cofres estavam cheios e a França e a Alemanha tinham de disfarçar, uma a sua fraqueza económica, a outra a sua importância política.

A participação dos cidadãos no que é a união europeia é residual, não há a construção como um dos seus fundadores, defendeu que mais do que comunidades, eram os homens que importavam juntar. A união europeia não vive pois uma construção democrática. A campanha eleitoral para eleger os deputados ao Parlamento Europeu já começou. Todos percebem que acima do inevitável voto, que muitos milhões irão dispensar, nada real se propõe. Como influencia o voto num ou noutro partido a sua própria acção? Ninguém sabe.


A Europa política não existe. Os seus dirigentes que já a governam como um Directório, não discutem o seu papel no Mundo. Pensam ainda na Europa que influencia o Mundo. A Europa não compreende o Mundo onde vive. E não tem respostas. Afasta os cidadãos, não os deixando participar na discussão de tratados importantes. A Europa só discute pormenores. E é naturalmente dominada pelos maiores orçamentos, os que os países mais importantes colocam aos economicamente menos representativos. Há uma real procura de coesão na Europa? 

Não, não há. E não há porque não são discutidos os aspectos que poderiam reforçar o equilíbrio regional dentro de cada País. Para os pequenos países o importante não é o Parlamento Europeu, é a Comissão Europeia e o Conselho Europeu. Todos sabem que neste último a representatividade dos países está dividida pelo poder dos mais fortes face aos mais fracos. E a Comissão? 

A Comissão Europeia foi habitada durante dez anos por um indivíduo que se revelou à moda dos centuriões romanos um bom operário do domínio imperial, aqui alemão, mas sem a cultura, sem a língua, sem a uniformidade cultural, sem a materialidade romanas. Na verdade, é preciso uma ética cósmica para se fazer da acção política uma ideia de espaço público. Do saudosismo maoísta, à ocupação do Iraque e à Comissão, revelaram-se apenas formas de gestão de fundamentalismos diversos. Como se percebeu muito cedo, não era a figura que a Europa precisava. Terá a Europa essa figura? Haverá uma figura que saiba alguma coisa da memória da Europa e a procure redimensionar à sua substância, acima do foclore político?

Vale assim a pena votar? Concerteza. Procurar fora do caminho da evidência financeira, os que propõem pensar, reflectir, sugerir alternativas, não os que vivem das ideias feitas, que apenas reproduzem cartilhas mal elaboradas, preguiçosas, sem humanismo, em que o espaço público como o definiu Hannah Arendt possa se materializar. É preciso lutar contra esta evidência que nos leva a desistir, pela corrupção nas ideias, pelo abanono na grandeza, pelo deserto de convicções.

É necessário reescrever a ideia de que é pensando nas opções, é votando que se evita que renunciemsos ao pensamento e a que possamos novamente repensar o que é humano. É preciso discutir as opções votando a quem pode lutar por esse fundamento. E todos sabemos que não é nos apóstolos do capital finaceiro que ele se encontra. É na nossa participação, na generosidade dos que ainda pensam.

(1) - Hannah Arendt, Between Past and Future: Eight Exercises in Political Thought.

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